Páginas

terça-feira, 15 de maio de 2012

Campeão Europeu já sofreu com o veneno coral

Um dos torneios mais importantes do futebol, a Eurocopa, é o encontro entre as seleções do Velho Mundo, realizado no intervalo de quatro anos, inclusive com direito à disputa de eliminatórias como nos campeonatos mundiais. Há quem afirme que a Eurocopa é uma Copa do Mundo sem a presença do Brasil e da Argentina. Para se ter uma ideia da grandeza e importância da competição, na última edição em 2004, em Portugal, a Euro foi responsável por aumentar em cerca de 1% o PIB do país naquele ano.


Alguns tricolores sabem que num amistoso, no início de 79, o Santa bateu a antiga Tchecoslováquia (hoje República Tcheca e Eslováquia) por 4x0, no Arruda. Mas, poucos se lembram que os tchecoslovacos haviam conquistado o título da Eurocopa.

Tchecoslováquia campeã da Eurocopa

Em 1976, a Tchecoslováquia desbancou a Alemanha na final, então campeã Mundial, em 74, e da própria Euro, em 72. Na disputa dos pênaltis, Antonín Panenka fez história ao cobrar no estilo “cavadinha”, como fazia Djalminha, no Palmeiras, e Marcelinho Carioca, no Corinthians. O meia europeu é considerado o precursor desse tipo de pênalti, daí surgiu a expressão “pênalti Panenka”, difundida em alguns países. Sua cobrança deu o primeiro, e único, título da Eurocopa da Tchecoslováquia até hoje.
Menos de três anos depois da conquista histórica, tricolores e tchecoslovacos teriam seus caminhos cruzados. Em fevereiro de 79, a baixíssima temperatura no Velho Mundo impossibilitava os treinamentos da Tchecoslováquia, que decidiu excursionar pela América Latina. Como a seleção se preparava para as Olimpíadas de Moscou, em 80, e para a Copa do Mundo, na Espanha, em 82, a intenção era testar o maior número de jogadores possíveis a fim de escolher os melhores. Dessa forma, eles enviaram duas seleções: uma viajou pelo Brasil, enquanto a segunda jogou em outros países da América do Sul. O time que chegou ao País era bastante renovado em relação ao time campeão europeu em 76 e a média de idade não passava dos 24 anos. Nada disso apagava a tradição dos tchecoslovacos, vice-campeões mundial em 34 e 62, como anunciava a imprensa pernambucana.
Na mesma época da excursão dos tchecoslovacos, o Mais Querido voltava de férias após uma temporada memorável. 1978 foi um dos melhores anos da história do Santa Cruz. No primeiro semestre, o clube foi o quinto colocado no Campeonato Brasileiro e estabeleceu a maior invencibilidade – 27 jogos – em nacionais, marca intocável até hoje. Como se não bastasse, o Santa foi campeão Pernambucano com uma vantagem impressionante. O tricolor conquistou os três turnos, marcou 112 gols em 28 jogos e sofreu apenas oito. Com uma média de quatro gols por jogo, a cobra-coral venceu 25, empatou dois e perdeu apenas um jogo no estadual, que terminou em dezembro. Os tricolores mereciam uma festa à altura na volta das férias, em janeiro de 79.
Dessa forma, o Santa Cruz promoveu o Torneio Quadrangular José do Rego Maciel. De um lado, Santa e Tchecoslováquia, enquanto que Náutico e Botafogo/ PB se enfrentavam para disputar uma vaga na final do torneio com o vencedor do outro jogo. “Nós estamos adotando o estilo europeu, sempre bem sucedido, promovendo uma rápida temporada. Lá, eles realizam constantes torneios assim. Acho que estamos seguindo um bom exemplo”, dizia o presidente tricolor Rodolfo Aguiar. Além disso, o Santa estava completando 65 anos com pompas de clube estruturado e moderno que era na época.

Santa Cruz recebe faixa de campeão de 1978
Em 7 de fevereiro, uma grande festa aconteceu no Arruda dando início ao torneio. Na preliminar, o Botafogo/ PB bateu o Náutico por 2x1, garantindo presença na final do Quadrangular. Logo depois foi a vez de Santa e Tchecoslováquia entrarem em campo. Antes de encarar o Terror do Nordeste, os europeus haviam sido derrotados uma vez (para o Internacional) e vencido três jogos (Figueirense, Maringá e Bahia). Quase 30 mil pessoas foram ao estádio e viram os tchecoslovacos entregarem as faixas aos campeões pernambucanos de 78. Os torcedores também presenciaram um passeio tricolor. 

Diário de Pernambuco anuncia grande jogo
Explorar as características ofensivas do time. Assim deveria ser o comportamento da equipe na visão do técnico Evaristo de Macedo: “Vamos jogar no ataque. Sempre conseguimos grandes vitórias assim.” O rápido toque de bola dos tchecoslovacos que impressionou os torcedores não foi suficiente para envolver os corais, em noite inspiradíssima. Uma forte marcação sob pressão anulou o time adversário e o seu jeito peculiar de jogar. 
Volnei e Neinha
O primeiro gol tricolor surgiu após uma jogada de Volnei, que havia substituído Jadir, em que ele cruzou para Neinha cabecear sem chances para o goleiro Cerverñan, no fim do primeiro tempo. Mesmo criando várias chances, a equipe deslancharia apenas na segunda etapa. Logo no início, Volnei recebeu de Betinho, o cérebro tricolor, e tocou na saída do goleiro. Pouco tempo depois a jogada se repetiu: passe de Betinho para Volnei chutar rasteiro e fazer 3x0 já aos nove minutos. O quarto e último gol aconteceu quando os torcedores gritavam olé, novamente com participação de Volnei e Betinho, mas o gol acabou sendo marcado por Neinha. Um Santa avassalador de muitas deslocações humilhou os campeões europeus.
Dois dias após a essa magnífica vitória, o tricolor se sagraria campeão do Torneio Quadrangular José do Rego Maciel ao derrotar o Botafogo/ PB por 1x0, com gol de Betinho, enquanto Náutico e Tchecoslováquia ficaram no empate por 1x1. O título do torneio jogando contra uma equipe internacional ajudou a preparar o Santa Cruz para uma excursão ao Oriente Médio e à Europa, já agendada anteriormente. Nela, o tricolor derrotou outra seleção européia (a Romênia, 4x2) e ganharia o título de Fita Azul por voltar invicto para casa. Ainda em 1979, a cobra-coral ficou com o bicampeonato Pernambucano, mais uma vez conquistando os três turnos.

Betinho, o maestro tricolor


Os socialistas, por sua vez, conquistariam a medalha de ouro nas Olimpíadas de Moscou, em 80, com alguns dos jogadores que estiveram no Quadrangular. Pelo menos sete dos que estiveram no Recife, em fevereiro de 79, formariam com os jogadores do outro time da Tchecoslováquia a equipe campeã olímpica. 

No fim da gloriosa década de 1970, o Santa Cruz passou a ser chamado também por Terror do Nordeste devido a grandes vitórias como essa contra a Tchecoslováquia. Ótimas campanhas em Brasileiros e títulos ganhos no Estado com folga ajudavam a reforçar o apelido. Fora de campo, o Mais Querido era exemplo de clube organizado.

Nenhum comentário:

Postar um comentário